O rebranding do Twitter para X, iniciada em julho de 2023, gerou uma grande repercussão nas redes sociais e pareceu não agradar ao público. Três meses depois, um levantamento da Ad Age apontou que 69% dos usuários dos Estados Unidos ainda chamam o X de Twitter e usam o termo “tweet” para se referir às publicações.
Os dados do estudo, feito em parceria com a The Harris Poll, apontaram, ainda, que 79% dos entrevistados estavam cientes da mudança, mesmo que a maioria ainda chame a plataforma de Twitter.
O rebranding da marca aconteceu nove meses após a compra da rede social pelo bilionário Elon Musk, que fez diversas mudanças na plataforma. Um ano após a aquisição, outro indicativo ruim da popularidade do X foi a queda de 15% no número de usuários mensais e de 54% da receita de anúncios da plataforma, segundo a Variety.
Esses números apontam que o público não aprovou as mudanças. E as perguntas que ficam para os profissionais de marketing são: Qual o O que deu errado no rebranding do X? O que poderia ter sido feito diferente? Há como melhorar?
Para analisar essas e outras questões acerca do tema, O Buzz entrevistou Clara Ramos, Gerente de Branding e criadora da página Branding de Propósito.
Os desafios do rebranding do Twitter para X
O Twitter foi criado em 2006 como uma rede social de conversas e textos curtos e se estabeleceu fortemente no mundo digital, a ponto de os termos exclusivos da rede social se tornarem parte do vocabulário oficial – como é o caso do termo “tweet”, que entrou para o dicionário Oxford em 2013.
Para Clara, um dos principais desafios do rebranding do Twitter, agora X, foi manter a consistência da marca, especialmente se tratando de uma rede social tão bem consolidada e ativa na mente dos usuários.
“Uma mudança abrupta ou mal comunicada pode desorientar os usuários e diluir a força da marca. No caso do Twitter, tínhamos um nome muito forte, que acabou virando verbo, e podemos ver no comportamento dos usuários de continuarem chamando a plataforma de Twitter e o ato de Twittar, que a consistência já tinha virado senso comum. Esse é o tipo de poder difícil de uma marca conquistar. Ser proprietário em um segmento é a missão de muitas equipes de marketing e nem todas vão conseguir, de fato”, afirma a especialista.
Além do nome, o rebranding do X acabou com o conhecido logotipo do passarinho azul, que acompanhava a rede social desde 2010 e era muito característico, rendendo ao Twitter o apelido de “rede social do passarinho”.
“Avaliando o rebranding do Twitter para X, o maior erro pode ter sido iniciar um rebranding sem uma necessidade clara e não levar em consideração o legado e o trabalho de marca já estabelecido na mente das pessoas. O rebranding não deve ser um fim em si mesmo, mas uma evolução natural que respeita e valoriza a história e a conexão emocional que os usuários têm com a marca”, afirma a gerente de branding.
As principais falhas no rebranding do Twitter para X
Para Clara, as principais falhas no rebranding do Twitter foram a falta de comunicação eficaz com os usuários, a escolha de um nome que não é memorável ou relevante e a falta de consistência com a identidade da marca. “Pra mim foram 3 falhas muito pontuais, que poderiam ter sido melhor trabalhadas, a não ser que tenham sido intencionais”, afirma.
“A mudança de nome para X representa uma ruptura com a identidade e a percepção da marca do Twitter, que já tinha um legado impagável. O nome X é difícil de pronunciar e de relacionar diretamente a algo, é genérico e não é claro o que ele representa ou oferece. Além disso, o Twitter não foi claro sobre os motivos e objetivos da mudança de nome. Isso levou à confusão e incerteza entre os usuários. O segredo [para um bom rebranding] está em encontrar o equilíbrio entre inovação e familiaridade, assegurando que qualquer mudança reforce a conexão da marca com seu público, ao invés de alienar“, explica.
Na época do anúncio da nova identidade visual, o X emitiu um comunicado de imprensa sobre as mudanças. A CEO da plataforma, Linda Yacarino, também publicou em seu perfil que a decisão de abandonar o nome Twitter em favor do enigmático X não foi apenas uma troca de letras, mas uma redefinição de identidade.
Isso porque o X tem planos de adicionar recursos de “áudio, vídeo, mensagens e serviços bancários, com o objetivo de criar um mercado global para ideias, produtos, serviços e oportunidades”, nas palavras da CEO.
Clara acredita, no entanto, que não houve muitos esforços e divulgação por parte do X para que o público criasse uma conexão com a nova identidade visual e nome da rede social.
“Não vemos nenhum movimento centrado nos usuários, e isso enfraquece a relação e a lealdade. Eles poderiam explicar de forma clara os objetivos, os benefícios da mudança pros usuários e alinhamento de expectativas. Também faltam campanhas e ações que incentivem a troca do nome para X na cabeça da galera”, afirma a especialista.
Apesar de pontuar os movimentos de falhas no rebranding, Clara acredita que ainda não é possível cravar se a reformulação da marca deu certo ou errado, uma vez que os objetivos e motivações dessas mudanças não ficaram claros para os usuários.
“Vendo as pesquisas podemos presumir que não deu certo, mas pra afirmar isso precisaríamos saber exatamente qual foi o objetivo da equipe com essa ação. Dependendo do objetivo da mudança, pode ser que tenha dado certo sim, ou que ainda vai dar. Por exemplo, pode ter sido um pensamento a longo prazo, ou uma ação para realmente promover esse choque e movimentar as coisas”, afirma, ressaltando que a falta de transparência na comunicação deixou o público confuso e impactou o processo negativamente.
Reação dos usuários
A reação dos usuários tornou-se um capítulo à parte nessa saga. O rebranding do Twitter para X, segundo a própria plataforma, não foi apenas uma alteração no alfabeto, mas uma tentativa de reescrever a relação com a plataforma. No entanto, a resistência dos usuários ressoou como descontentamento, afetando a percepção da marca.
Quando o anúncio do rebranding foi feito, o movimento recebeu duras críticas do público na própria plataforma e, como tudo no X/Twitter, também virou alvo de memes.
(Usuários insatisfeitos com a mudança do Twitter para X na rede social. Imagens: Reprodução/X)
“O Twitter também foi construído pelos usuários, são eles que mantém a máquina funcionando, na minha visão faltou transparência com um público tão importante para sustentabilidade do negócio. Isso pode levar a uma perda de confiança e fidelidade dos usuários. Mas por outro lado vemos outras identificações e relações nascendo desse movimento”, disse Ramos ao O Buzz.
A falta de pesquisa e entendimento do público-alvo é um dos principais erros cometidos pelas empresas na hora de planejar um rebranding, segundo Clara.
“É crucial não subestimar o impacto emocional que a mudança pode ter sobre os usuários leais. E pensando assim precisamos evitar que a ansiedade nos leve à mudanças desnecessárias. Às vezes as empresas apelam para um rebranding sem necessidade e sem explorar tudo que a marca atual oferece de valor”, pontua.
Rebranding do X e competitividade
Em julho, dias após o rebranding do Twitter para X, a Meta lançou o Threads, apresentando-se como um concorrente direto. Ainda de acordo com a pesquisa da Ad Age, citada anteriormente, 57% dos entrevistados tinham conhecimento do Threads, e 47% deles criaram uma conta na plataforma no momento do lançamento.
Os dados revelam que, mesmo após o entusiasmo inicial diminuir, 60% dos adultos norte-americanos que se cadastraram no Threads continuam a acessar o aplicativo com certa frequência, pelo menos algumas vezes por mês. Além disso, 69% dos usuários tanto do X quanto do Threads nos EUA expressaram preferência pelo X.
Ao abordar a competição entre as duas redes, Clara acredita que o Threads nasceu grande, mas ainda não é tão grande quanto o X. “Logo após o rebranding vimos a bolha estourar com o lançamento do Threads. Mas vimos também que mesmo com a mudança e o nascimento de um concorrente à altura, o X continuou firme e forte”, diz.
Além disso, em outubro de 2023, quando a aquisição do Twitter por Musk completou um ano, foi registrada uma queda de 15% no número de usuários mensais e de 54% na receita de anúncios, segundo a Variety.
A incerteza gerada pelo rebranding é apontada por Clara como uma das causas para essa queda nos números, além de outros fatores, como mudanças na estratégia de negócios, reações do público a decisões controversas e polêmicas de Elon Musk e falta de identificação.
“Inclusive é notável que esses impactos não tenham sido ainda maiores. Isso se deve, em grande parte, à relevância da plataforma pros seus usuários. O Twitter se estabeleceu como um espaço vital pro discurso público, a troca de informações e a formação de comunidades”, comentou Clara Ramos sobre a queda.
Reparação dos erros
Esse momento após uma mudança de nome controversa e não bem aceita pelo público, para Clara, deve ser seguido por uma estratégia de mitigação para diminuir as preocupações dos usuários e reconstruir a confiança na plataforma.
“O Twitter poderia focar em comunicação aberta, transparente e frequente. Além disso, é importante demonstrar comprometimento em manter ou elevar a qualidade do serviço e ouvir ativamente o feedback dos usuários, ajustando a estratégia conforme necessário”, pontua a especialista.